quinta-feira, 13 de outubro de 2016

PEC 241: ANALISANDO O OUTRO LADO DA QUESTÃO - José Souto Tostes

Infelizmente as redes sociais vêm sendo culpadas pela disseminação de ideias erradas sobre a tal PEC 241. Reproduzir a “opinião” alheia virou moda. Chegam a dizer que a PEC 241 vai tirar dinheiro dos pobres e dar aos ricos. Que estão tirando recursos da educação e da saúde e colocando-se sei lá onde.

Juntam a essa bagunça um parlamentar gravado falando besteira, no corredor do Congresso Nacional e ele passa a ser o porta-voz desses reprodutores de opinião alheia. Corporativistas e de forma seletiva, também desavisadas, entidades classistas entram na propaganda e arrefecem os ânimos, trazendo o ilustrado médico oncologista Draúzio Varella, para referendar uma ideia canhestra sobre a PEC 241.

Parece difícil lutar contra tudo isso, mas o primeiro passo para quem quer entender o problema, é ler o texto da PEC. Mas o texto é cheio de termos técnicos, que a maioria não conhece. Os juristas poderiam ajudar, mas nem isso aconteceu, pois vi muitas análises seletivas, ou seja, canhestras, distorcidas mesmo.

Então, vamos, juntos, tentar dissecar a legislação proposta e traduzir, para qualquer cidadão, o que consta, realmente da PEC. Mas antes de adentrar nessa tarefa, convém ressaltar que a nossa análise é da lei, não é do governante, não é do ministro, nem do presidente que a aplicará. Essa análise subjetiva, não cabe aqui. Lei é lei. Aplicação de lei é outra coisa. Para isso, os guardiões da aplicação da lei estão aí, o Judiciário. Havendo dúvidas, neles buscaremos salvação.

A PEC é uma proposta de emenda constitucional, que deverá ser votada pelo Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado) em dois turnos. Ela acrescenta artigos nos chamadaos atos das disposições constitucionais transitórias (ADCT), para instituir um novo regime fiscal. Esse novo regime, aplicável a todos os entes públicos, irrestritamente, terá prazo de vigência de 20 anos. Essa PEC tem três artigos. Ela acrescenta os artigos 102, 103, 104 e 105 na Constituição Federal. É muito pequena para este estardalhaço todo, apesar de implantar uma linha econômica de enxugamento do Estado brasileiro, muito séria e necessária, diga-se de passagem.

Qual é o objetivo principal da PEC 241? Estabelecer um equilíbrio nas contas públicas. Ela reconhece, que o Estado brasileiro (onde incluem-se União, Governos Estaduais e Municípios) gasta muito mal os seus recursos. Gasta mal com folhas de pagamentos mal geridas, onde existem marajás e existem pessoas ganhando muito aquém do que mereciam, gastam mal com compras sem planejamento e compras e contratações superfaturadas, gastam mal com as previdências (Federal, Estadual e Municipal), desde a aplicação errônea e criminosa de recursos previdenciários, até o pagamento de pensões a quem tem condições de trabalhar e tantos outros exemplos de sangria, sem planejamento, dos parcos recursos dos tesouros.

O país, infelizmente, fruto de má gestão, está quebrando. O jornal Estadão, noticiou que vários governos Estaduais terão dificuldades de pagar o décimo terceiro salário dos servidores no final do ano. O Estado do Rio de Janeiro já faliu. Existisse um teto que obrigasse os Estados a gastar só o que arrecadam, essas falências seriam evitadas. Esse é o alvo da PEC 241.

A lógica é a seguinte, ou arrocha e gasta menos, o que todos fazem em suas economias, gastam com eficiência, ou deixa como está e aumentam-se impostos, tirando do trabalhador, do pobre e de quem não tem como pagar. A PEC implanta o arrocho nas contas públicas e não na população.

Entre 2008-2015 as despesas do Poder Público cresceram 51%, enquanto a receita aumentou apenas 14,5%. Invertendo a lógica da principal questão posta em debate: nesse período, a educação e a saúde melhoraram no país? Nesse período, acabaram os marajás das folhas de pagamento do Legislativo e do Judiciário? Onde foi parar esse dinheiro? Quantos contrataram com o Poder Público e não receberam o que era devido? Pois faltou pra alguém...

A educação e a saúde estão relegadas a segundo plano nas prioridades de investimento há muitos anos. Será que só agora, com o controle mais efetivo dos gastos é que essa lógica se inverterá?

O Brasil precisa aprender a “se virar” com o “salário” que tem, sem se valer de empréstimos e da ficção orçamentária, que depois volta e volta em forma de enormes sacrifícios. Uma economia ajustada tem muito mais chance das verdadeiras prioridades serem atendidas.

Quem sofre? Sofre quem assume contrato com o Poder Público e fica a ver navios, pois o Estado dá o calote e fica por isso mesmo. Quantas empresas já não quebraram por isso? A lógica é a seguinte, o Estado gasta o que não tem, assume contratos ou obrigações e não honra as mesmas. Prova maior disso é a situação das chamadas pedaladas, que o governo tomava dinheiro emprestado dos bancos para pagar obrigações suas.

O que causa estranheza nos críticos do regime é que todos, unanimemente, antes da medida proposta pelo governante de plantão, falavam que o Estado deveria dar o exemplo e cortar gastos, reduzir o tamanho da máquina, diminuir seus luxos e gastos excessivos, mas quando essa medida de redução do Estado é implantada, todos chiam também de forma conjunta. Tem alguma coisa errada!

Voltemos à lei proposta ao Congresso:

Novo artigo 102 da Constituição Federal terá o seguinte texto:

“Será fixado, para cada exercício, limite individualizado para a despesa primária total do Poder Executivo, do Poder Judiciário, do Poder Legislativo, inclusive o Tribunal de Contas da União, do Ministério Público da União e da Defensoria Pública da União”.

Esse artigo deixa muito claro, que o limite será implantado em todos os entes públicos (Executivo, Judiciário, Legislativo), sendo que a lei chega a destacar que as gorduras serão tiradas até do Ministério Público, Tribunal de Contas da União e Defensoria Pública. Esses entes já estariam inseridos no Poder Executivo, mas o legislador resolveu dar ênfase, para que não existissem dúvidas que eles seriam atingidos.

Vejamos o que diz o parágrafo 2º desse novo artigo 102:

§ 2º Os limites estabelecidos na forma do art. 51, caput, inciso IV, do art. 52, caput, inciso XIII, do art. 99, § 1º, do art. 127, § 3º, e do art. 134, § 3º, da Constituição, não poderão ser superiores aos fixados nos termos previstos neste artigo.

O que isso quer dizer é que a autonomia de gastos do Legislativo e do Judiciário foram limitadas ao que dispuser a União, ou seja, a liberdade daqueles aumentos abusivos que foram aprovados recentemente, para alguns órgãos, não poderão mais ocorrer nesse novo regime. Não vi ninguém louvando isso, que é digno de ser aplaudido, vez que se o Executivo está com arrocho salarial, nada mais justo que o mesmo ocorrer nos demais entes públicos.

O artigo 104 da PEC 241 modifica a forma de interpretação dos gastos mínimos com educação e saúde, que hoje são 15% para a saúde e 25% para a educação. O que muda na verdade não é o valor investido em saúde ou educação, mas a forma de reajuste desse valor. Hoje é um percentual fixo de 15 e 25%, no novo regime será o valor do ano anterior reajustado para o novo ano.

Essa nova fórmula não é impeditiva de que aplicações, além do limite mínimo, sejam utilizadas. Repetindo, os percentuais fixam valores mínimos.

Mas a pergunta que se faz é a seguinte: do jeito que está a saúde e a educação estão boas? Há satisfação por parte dos profissionais e dos usuários da saúde pública e da educação pública? Se houvesse essa satisfação eu entenderia a grita, mas se não há, qualquer mudança é válida. A verdade é que dinheiro sendo gasto sem critérios e limites não resolveu o problema.

O que adianta a obrigatoriedade desse limite ser 15 ou 25% da receita e os valores serem desviados ou mal aplicados? Dessa questão surgem outras, como a necessidade imperiosa de reforma política, para reduzir partidos, reduzir a máquina legislativa, mudar os mecanismos eleitorais defasados, num país que usa urna eletrônica, mas que não sabe apurar votos e o mais votado nem sempre é o eleito, mudar a legislação previdenciária, para que sejam aposentados e beneficiados os que realmente trabalharam, mudar a legislação da própria saúde e do seu regime de contratação e aplicação de recursos, mudar a legislação educacional, mudar a legislação de licitações e contratos, para regras modernas e passíveis de fiscalização e tantas outras que terão nascedouro nesse novo Estado equilibrado que é proposto na PEC 241.

O Brasil precisa ter a sua história reescrita. Há anos, muito antes do PT, diga-se de passagem, a coisa precisa de reparos, não podemos mais esperar. A população precisa que os recursos sejam gastos com eficiência, clareza e transparência. Essa legislação será do país e não do governante de plantão ou de quem o sucedê-lo. Ler o texto (ou não ler, como faz a maioria) com a visão já preconceituosa tem sido o maior mal, soma-se a isso que o próprio governo não explicou bem a situação, por isso, deu no que deu.

É fantasia imaginar que só agora a coisa vai piorar, pois para usar a frase do famoso Tiririca, pior que está, não fica. E com a implantação dos regimes de contenção, os recursos saídos dos gastos excessivos dos outros programas, serão investidos nas maiores prioridades, saúde e educação, podem ter todos certeza.


Um país equilibrado, com contas ajustadas, terá muito maior capacidade de investir em questões prioritárias, do que um país quebrado onde não há limites para reajustes abusivos por um lado e inexistência de ajustes por outro, vide exemplo do Judiciário recente, onde foram aprovados ajustes muito acima do que foi concedido a outros entes. Essas distorções vão acabar sim.

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