terça-feira, 9 de maio de 2017

Especial A TERCEIRIZAÇÃO - Índio do Brasil Cardoso

Segundo conceito doutrinário firmado antes da Lei 13.429.2017, “O fenômeno da terceirização consiste em transferir para outrem atividades consideradas secundárias, ou seja, de suporte, atendo-se a empresa à sua atividade principal. Assim, a empresa se concentra na sua atividade-fim, transferindo as atividades-meio. Por atividade-fim entenda-se aquela cujo objetivo a registra na classificação socioeconômica, destinado ao atendimento das necessidades socialmente sentidas”.

              Antes a terceirização apenas podia ocorrer para atividades-meio, ou seja, aquelas que não se resumem no objeto principal da empresa, sob pena de ser considerado nulo o contrato de trabalho com a empresa prestadora de serviços e o consequente reconhecimento de vínculo empregatício com a tomadora. 

                   A responsabilidade subsidiária, mesmo quando tratando-se de terceirização lícita, sempre existiu.

           Em que pese não houvesse legislação específica quanto ao tema, há tempo o TST editou súmula que vem regulamentando essas relações, que é a súmula 331, que segue na íntegra:

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 
I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974). 
  
II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988). 
  
III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta. 

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. 
  
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. 
  
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.

 
                   Com efeito, o ponto que merecia maior atenção era exatamente a prevenção quanto à contratação por empresa interposta. Nesses casos, sendo observados todos os requisitos do contrato de trabalho (pessoalidade, subordinação, onerosidade, habitualidade) era reconhecido (repetimos) o vínculo direto com a tomadora. O impacto financeiro era a empresa ter que arcar com todas as parcelas trabalhistas do período que o sujeito prestou serviços (FGTS, férias + 1/3, trezenos etc).
 
                   A despeito disso, mesmo que a prestação de serviços fosse através de empresa terceirizada mediante contrato de prestação licito, ainda assim há risco para a tomadora. Nestes casos, em que pese não haja reconhecimento de vínculo direto, havia a responsabilidade subsidiária quanto aos créditos devidos pela empresa empregadora.

                   A mudança ocorrida é exatamente a possibilidade de se terceirizar a atividade-fim, o que praticamente extingue a possibilidade de declaração de nulidade de contrato de trabalho com a prestadora e reconhecimento de vínculo com a tomadora.

                  Com efeito, dentre as mudanças introduzidas pela Lei 13.429/2017, que alterou a 6.019/74, vislumbra-se o art. 4ª-A, que define o que “empresa prestadora de serviços:

Art. 4o-A.  Empresa prestadora de serviços a terceiros é a pessoa jurídica de direito privado destinada a prestar à contratante serviços determinados e específicos.    (grifamos)
§ 1o  A empresa prestadora de serviços contrata, remunera e dirige o trabalho realizado por seus trabalhadores, ou subcontrata outras empresas para realização desses serviços.    
§ 2o  Não se configura vínculo empregatício entre os trabalhadores, ou sócios das empresas prestadoras de serviços, qualquer que seja o seu ramo, e a empresa contratante.   (grifamos).

 

                   A mudança principal, no nosso sentir, é exatamente o art.4º, § 2ª supra. Ali é possível identificar a clara vedação ao reconhecimento de vínculo empregatício com a tomadora, “qualquer que seja seu ramo”, permitindo, portanto, que funções inerentes à atividade-fim possam ser terceirizadas.

                   Outro aspecto é pertinente aos requisitos de funcionamento da empresa terceirizada, cujo rol descritivo constante do art. 4º-B:

Art. 4o-B.  São requisitos para o funcionamento da empresa de prestação de serviços a terceiros:     (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
I - prova de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ);     (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
II - registro na Junta Comercial;     (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
III - capital social compatível com o número de empregados, observando-se os seguintes parâmetros:     (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
a) empresas com até dez empregados - capital mínimo de R$ 10.000,00 (dez mil reais);     (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
b) empresas com mais de dez e até vinte empregados - capital mínimo de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais);     (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
c) empresas com mais de vinte e até cinquenta empregados - capital mínimo de R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil reais);     (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
d) empresas com mais de cinquenta e até cem empregados - capital mínimo de R$ 100.000,00 (cem mil reais); e     (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
e) empresas com mais de cem empregados - capital mínimo de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais).    (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)

 
                   Assim, em eventual contratação de empresa terceirizada, sugerimos fortemente que esses requisitos sejam observados, exatamente no intuito de prevenir declaração de irregularidade da empresa prestadora, e por via de consequência, do contrato de prestação de serviços.

                   Outrossim, o art. 5ª-A especifica o que seria uma empresa contratante e traz em seus parágrafos algumas restrições (novamente destaca-se as mais importantes):

Art. 5o-A. Contratante é a pessoa física ou jurídica que celebra contrato com empresa de prestação de serviços determinados e específicos.    (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
§ 1o  É vedada à contratante a utilização dos trabalhadores em atividades distintas daquelas que foram objeto do contrato com a empresa prestadora de serviços.     (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017) (grifamos).
§ 2o  Os serviços contratados poderão ser executados nas instalações físicas da empresa contratante ou em outro local, de comum acordo entre as partes.     (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
§ 3o  É responsabilidade da contratante garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores, quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local previamente convencionado em contrato.     (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017) (grifamos).
§ 4o  A contratante poderá estender ao trabalhador da empresa de prestação de serviços o mesmo atendimento médico, ambulatorial e de refeição destinado aos seus empregados, existente nas dependências da contratante, ou local por ela designado.     (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
§ 5o  A empresa contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços, e o recolhimento das contribuições previdenciárias observará o disposto no art. 31 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991.    (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)


 
   
                 Por fim, o contrato de prestação de serviços possui elementos básicos obrigatórios pela lei (constante do art. 5º-B):
 
- qualificação das partes;
especificação do serviço prestado;
- prazo para realização do serviço;
- valor;

                   Abrimos outro parêntese para esclarecer que, no nosso entendimento, a figura jurídica da intermediação de mão de obra não estaria extinta, devendo ser observadas as regras do § 1º do art. 5º-A para assegurar que a responsabilidade seja apenas subsidiária, evitando ao máximo os riscos da empresa (leia-se: declaração de relação de emprego diretamente com a tomadora).

                        Assim, repetimos: em todo caso de terceirização, mesmo que seja para execução de serviços inerentes à atividade-fim, devem ser observados os requisitos descritos na Lei, tanto no que se refere: às atividades exatas exercidas pelo prestador (trabalhador) de serviços (art. 4ª –A e 5ª-A;); requisitos de validade de constituição da empresa prestadora de serviços (art. 4ª-B); bem como os elementos essenciais do contrato firmado entre as partes (art. 5º-B).
                 
          Em (apertadíssima) síntese, sem intenção alguma de exaurir o assunto, é parecer.

          Ficamos à disposição para quaisquer esclarecimentos.

Índio do Brasil Cardoso, advogado e professor da UFF.

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